segunda-feira, 17 de junho de 2013

Centro de Educação desenvolve pesquisa na área de Educação de Jovens e Adultos

 Centro de Educação desenvolve pesquisa na área de Educação de Jovens e Adultos
Ação é do Observatório Alagoano de Leitura em EJA, financiado pela Capes até 2015 e tem como foco a formação continuada do professor
17 de Junho de 2013
Centro de Educação desenvolve pesquisa  na área de Educação de Jovens e Adultos
A coordenadora Marinaide Freitas (ao centro) com participantes da pesquisa sobre Educação de Jovens e Adultos
Diana Monteiro – jornalista 
O conhecimento é inerente ao ser humano e a leitura consiste em ferramenta fundamental em todo o processo do aprendizado, sendo a sala de aula o lugar comum para a concretização do sonho daqueles que procuram a escola pela vontade de aprender a ler e, consequentemente, adquirir conhecimento. Foi analisando a efetivação do processo ensino-aprendizagem na Educação de Jovens e Adultos (EJA) em Maceió, e seus possíveis entraves, que um grupo de pesquisadores do Centro de Educação (Cedu) e do Instituto de Ciências Humanas, Comunicação e Artes (ICHCA), da Universidade Federal de Alagoas, coordenado pela professora Marinaide Freitas, vem desenvolvendo estudos tendo como foco a leitura na formação continuada de professores. 
A pesquisa “A leitura e a formação de leitores no Estado de Alagoas: estudo e intervenção de alfabetização em Educação de Jovens e Adultos”, está em desenvolvimento desde 2011 e contempla 120 alunos na faixa etária de 15 a 80 anos de idade de 4 escolas públicas da capital. Da rede municipal de ensino participam da pesquisa as Escolas de Ensino Fundamental Dr. Orlando Araújo e João XXIII, respectivamente, localizadas nos bairros de Ponta Verde e Jacintinho, e na rede estadual a ação pedagógica nas Escolas Guilhermino de Oliveira, na Gruta de Lourdes e Mário Broad, na Jatiúca. 
A necessidade de intervenção pelo Observatório Alagoano da Leitura surgiu por considerarmos alarmante o Índice de Desenvolvimento do Ensino Básico (IDEB) de Alagoas. O estudo foi centralizado no Programa de Jovens e Adultos por se constatar que 90 por cento desses já tinham frequentado a escola”, frisa Marinaide Freitas, destacando que a causa das repetidas entradas e saídas da escola tem como principal causa no Estado, a exclusão social. Referência na área, o projeto já gerou publicações nacionais e internacionais e apresentado em eventos no país e também no exterior, a exemplo de Portugal. Mais recentemente, a pesquisa integrou, como  mesa-redonda,  a programação do I Caiite.
O estudo, campo de aprendizado em graduação e pós-graduação (mestrado e doutorado) em Educação, envolve Grupos de Pesquisa do Centro de Educação, como o Multidisciplinar em Educação de Jovens e Adultos (Multieja) e Aquisição de Linguagem em Educação; o Comunicação e Multimídia (Comulti/COS), do Instituto de Ciências Humanas Comunicação e Artes (ICHCA), contando com participação de  docentes e estudantes bolsistas do Programa Institucional de Iniciação Científica (Pibic) e da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal do Nível Superior (Capes),  que integram o Observatório Alagoano de Leitura em EJA. O laboratório do Estado é vinculado ao Observatório da Educação (OBEDUC/Capes). 
 “Estamos formando recursos humanos qualificados para a atuação em EJA no Estado, que envolve também representantes das escolas contempladas pelo projeto. A intervenção também tem sido objeto de estudo em cursos de pós-graduação, abrindo um novo e promissor campo de atuação pedagógica, a exemplo dos trabalhos em desenvolvimento da mestranda Valdilene Barros e das doutorandas Adriana Santos e Valéria Cavalcante”, destaca Marinaide, doutora na área. 
O projeto, iniciado em 2011, tem conclusão em 2015, é financiado pela Capes que destina bolsas de estudos e recursos para aquisição de equipamentos instalados no Núcleo de Estudos, Pesquisa e Extensão sobre Alfabetização (Nepeal), localizado no Centro de Educação. “Podemos citar como saldo positivo o interesse da comunidade assistida pelo Observatório para a manutenção do projeto, assim como a valorização e a intervenção, principalmente por parte dos alunos, parceiros fundamentais na ação pedagógica”, afirma Marinaide Freitas. 
Projeto-piloto 
A Escola Estadual Guilhermino de Oliveira, selecionada para o projeto-piloto, teve as ações concluídas em 2012, mas a rotina do Programa EJA que dispõe de cerca de 70 alunos matriculados, continua com o acompanhamento da equipe da Ufal. Segundo a coordenadora Marinaide, as demais escolas envolvidas estão nas fases de Sessões de Estudo e de Reflexão e retorno às aulas, que consistem nos passos subsequentes após o diagnóstico inicial. “O projeto adequa-se ao calendário escolar das redes municipal e estadual, que seguem diferentes tempos nas escolas objeto de estudo”, frisa. 
A coordenadora pedagógica da Escola Guilhermino de Oliveira, no bairro Gruta de Lourdes, professora Elizabete de Castro Santana, destaca como saldo positivo do projeto, o apoio aos alunos, a intervenção pedagógica, como também as mudanças pedagógicas ocorridas em sala de aula pela professora. “Os alunos  despertaram para o valor da leitura na sala de aula e em sua prática, o que foi fundamental para a redução da evasão escolar até então existente”, frisa Elizabete.
Passei a ter uma nova visão sobre a EJA, com a consciência de que o resgate do valor dessa Educação tem que ser feito por nós, alunos, professores, coordenadores e diretores”, diz a professora Eleide Xavier, acrescentando  que o trabalho do Observatório abriu para ela novos horizontes na citada área. 
EJA e qualificação docente 
O projeto na Escola Municipal João XXIII, no bairro do Jacintinho, está nas etapas de Sessões de Estudo e de Reflexão. Envolve todo o grupo-escola, mas segundo a professora Ana Helena Matos, a positividade do projeto da Ufal já é constatada. “São muitos os ganhos com as ações do Observatório Alagoano de Leitura que se volta à formação continuada do professor. Os alunos despertaram para a leitura, demonstrando o desejo de ler e, consequentemente, de adquirirem conhecimento”. 
A importância do projeto para a formação inicial agrega teoria-prática e é destacada pelos alunos do curso de Pedagogia que participam como bolsistas do Observatório Alagoano de Leitura. “A partir da disciplina Educação de Jovens e Adultos, na grade curricular do curso, o projeto permitiu colocar em prática a relação teoria-prática, observando-se o melhor desempenho do professor em sala de aula”, disse a bolsista Fernanda Rafaela da Silva. 
O problema relacionado à leitura, segundo a mestranda Valdilene Cardoso que concluirá o curso em 2015, existe na própria graduação em Pedagogia e considera ser o projeto uma contribuição também para a formação acadêmica. “Inicialmente eu quis me qualificar em Educação Infantil, mas o Observatório Alagoano de Leitura despertou meu interesse para trabalhar com a Educação de Jovens e Adultos”, disse. São da mesma opinião o graduado em Pedagogia Reinaldo Batista e a aluna Luciana Gomes (bolsista PIBIC). Eles, que vêm se qualificando vislumbrando a atuação profissional na área, revelam que a experiência é gratificante por produzir mais conhecimentos em EJA.   
Atuação do Observatório de Leitura 
O projeto nas escolas se desenvolve em etapas, iniciando-se com a observação das aulas de leitura ministradas pelas professoras que são objetos de estudo. “A partir dessa observação realizamos um diagnóstico que é apresentado à escola propondo outras possibilidades de trabalhar a leitura, sem quebrar a autonomia existente. Nas escolas-alvo não houve nenhuma resistência à intervenção colaborativa”, diz a coordenadora do projeto. Na segunda etapa são realizadas as Sessões de Estudo, Reflexão e o retorno às observações das aulas, constituindo-se num processo de ação-reflexão-ação. 
Segundo Marinaide, com a falta de estrutura existente nas escolas o fator pedagógico é afetado, e isso implica também na falta de valorização profissional para a dedicação exclusiva à atividade. “O projeto mexe com a estrutura da escola propondo acesso aos mais variados bens culturais para que o sujeito (jovem, adulto e idoso) tenha acesso às bibliotecas, por exemplo. A criação de uma rede de formação continuada nas escolas, nesse formato, diz a doutoranda Adriana Santos será possível a partir das condições concretas em parceria com os poderes públicos municipal e estadual. 
Integram o Observatório Alagoano de Leitura os seguintes docentes e discentes: Marinaide Freitas; Nadja Naira Aguiar Ribeiro; Adriana Cavalcanti dos Santos; Edna Telma Vilar; Antonio de Freitas;Valéria Campos Cavalcante (docente na SEEE/AL e Cesmac). Como bolsistas da Capes, o pedagogo Reinaldo Batista Santos; Fernanda Rafaela da Silva; e Sanclésia Batista Ferreira. Pelo Pibic: Luciana Gomes Silva; Rafaella Calaça de Oliveira; e a pedagoga Valdilene Cardoso de Barros. 
São colaboradoras do projeto as professoras Ana Helena Matos, da Escola Municipal João XXIII; Dagmar Cristina Matias, da Escola Municipal Orlando Araujo; Eleide Ferreira Xavier, da Escola Estadual Guilhermino de Oliveira e a coordenadora do EJA; e Maria Cristina Cruz, da Escola Estadual Mário Broad. O projeto já está no ciberespaço, com o blog Observatório Alagoano de Leitura em EJA (em fase de atualização pela coordenação de multimídia) no endereço : http://observatorioalagoanodeleituraemeja.blogspot.com.br/.

http://www.ufal.edu.br/noticias/2013/divulgacao-cientifica/centro-de-educacao-desenvolve-pesquisa-na-area-de-educacao-de-jovens-e-adultos

domingo, 22 de maio de 2011

Texto Argumentativo 2

Alguém fala errado?
Sei muito bem que, de acordo com a linguística moderna, não existem o certo e o errado no uso do idioma nacional, ou melhor, não existe o errado, o que significa que tudo está certo e que minha antiga professora de português, que me ensinou a fazer análise lógica e gramatical das proposições em língua portuguesa, era uma louca, uma vez que a língua não tem lógica como ela supunha e a gramática é de fato um instrumento de repressão; perdeu seu tempo dona Rosinha ensinando-me que o verbo concorda com o sujeito, e os adjetivos com os substantivos, como também concordam com estes os artigos, ou seja, que não se deve dizer dois dúzias de ovos, uma vez que dúzia é palavra feminina, donde ter que dizer "duas dúzias de ovos", o que era, como sei agora, um ensinamento errôneo ou, no máximo, correto apenas naquela época, pois hoje ouço na televisão e leio nos jornais "as 6 milhões de pessoas", construção indiscutivelmente correta hoje, quando os artigos não têm mais que concordar com os substantivos e tampouco com o verbo, como me ensinara ela, pois me corrigia quando eu dizia "ele foi um dos que fez barulho", afirmando que eu deveria dizer "um dos que fizeram barulho", e me explicava que era como se dissesse "foi um dos três que fizeram barulho", explicação antiquada, do mesmo modo que aquela outra referente à regência dos verbos e que eu, burróide, entendi como certo quando, na verdade, o certo não é, por exemplo, dizer "a comida de que ela necessita" ou "o problema de que falou o presidente", e, sim, "o problema que falou o presidente", frase que, no meu antiquado entendimento, resulta estranha, pois parece dizer não que o presidente falou do problema, mas que o problema falou do presidente, donde se conclui que sou realmente um sujeito maluco, que já está até ouvindo "vozes" e, além de maluco, fora de moda, porque não se conforma com o fato de terem praticamente eliminado de nossa língua as palavras "este" e "esta", que foram substituídas por "esse" e "essa", pois sem nenhuma dúvida é uma tolice querer que o locutor da televisão, referindo-se à noite em que fala, diga "no programa desta noite" em lugar de "no programa dessa noite", que, dentro do critério de que o errado é certo, está certíssimo, ao contrário do que exige esta minha birra, culpa da professora Rosinha, por ter insistido em nos convencer de que "este" designa algo que está perto de mim, "esse", algo que está perto de você e "aquele", o que está longe dos dois, e ainda a minha teimosia em achar que essas palavras correspondem a situações reais da vida, não são meras invenções de gramáticos; e, de tão sectário que sou nesta mania de preservar a língua, não suporto ouvir a expressão "isto não significa dizer" em vez de "isto não quer dizer", que é o correto, ou era, além de expressão legítima, enquanto a outra é um anglicismo, mas que, por isso mesmo, há quem considere ainda mais correta, porque estamos na época da globalização, o que torna mais bobo ainda implicar com estrangeirismos, como aquele meu amigo que fica irritado ao ler nos jornais que "a reunião da Câmara foi postergada para segunda-feira", em vez de "adiada", como sempre se disse e que facilita o entendimento da maioria das pessoas, já que nem todos os brasileiros amargaram o exílio em países de língua espanhola. Mas já quase admito ser muita pretensão teimar em dizer "o governador cogita de enviar à Câmara um novo projeto de lei", pois isso de que o verbo "cogitar" rege a preposição "de" também é bobagem, coisa de gente pretensiosa que precisa se impor às outras falando arrogantemente "correto", como se houvesse modo de falar certo ou errado, de falar correto, pois a verdade é que tal pretensão oculta um preconceito de classe, uma discriminação contra aqueles que não tiveram oportunidade de estudar e, por essa razão, não podem falar como os que usufruíram do privilégio burguês, ou pequeno-burguês, de estudar gramática, o que vem acentuar a injustiça social. Como se não bastasse serem aqueles pobres discriminados no trabalho e no conforto, ainda se acrescenta essa discriminação, acusando-os de falarem mal a língua, da qual são eles de fato os criadores e que foi apropriada pelos ricos e poderosos que agora se consideram donos dela, como de tudo o mais que existe neste mundo, pois eles de fato não toleram a hipótese de que todas as pessoas sejam iguais e que todas elas falem corretamente ainda que gramáticos elitistas insistam em dizer que falam errado só porque não falam segundo as normas da classe dominante, que, além de impedir os pobres de estudar, acusam-nos de serem ignorantes, atitude de fato inaceitável, pois sabemos que todas as pessoas são igualmente inteligentes e talentosas, portanto capazes de criar obras de arte geniais, de conceber teorias iguais às que conceberam Galileu e Einstein, e só não o fazem porque são deliberadamente impedidas de dar vazão a seu gênio criador; e também neste caso se comete a injustiça de consagrar como gênios alguns homens privilegiados e não atribuir qualquer valor aos milhões, perdão, às milhões de pessoas tidas como comuns, e só não consigo entender é por que os lingüistas que defendem tais idéias continuam a escrever corretamente tal como exigia minha professora do colégio São Luís de Gonzaga, naqueles distantes anos da década de 1940... Diante disto, não está mais aqui quem falou.
GULLAR, Ferreira. Alguém fala errado? Folha de São Paulo, São Paulo, 25 set. 2005.

Texto Argumentativo

João Soares Neto – Escritor – Matéria publicada na seção OPINIÃO – IDÉIAS – DIARIO DO NORDESTE – 19.04.2009

Não sou dos que fazem muita fé no acordo ortográfico entre países de língua portuguesa. Não acredito que trema, hífen, acento etc. sejam a solução para as nossas diferenças no falar e no escrever. Somos 190 milhões de brasileiros. Os do Sul do país falam com sotaques e vocabulários diferentes dos do Nordeste e do Norte. Os do Centro-Oeste têm peculiaridades que os do leste não compreendem. Imaginem os outros países lusofônicos, com diferenças nítidas na comunicação. O Português em África é distinto do falado em Portugal. Essas regras são uma tentativa para dar identidade ortográfica ao Brasil, Portugal, Cabo Verde, Guiné-Bissau, São Tomé e Príncipe, Angola, Moçambique e Timor Leste. Eles somam 30 milhões de pessoas. Fique claro que não sou lingüista (se escreve com trema ou sem trema?), mas leitor compulsivo. Agora mesmo, estive lendo o livro alemão ´Neblina sobre Mannheim´ traduzido, em Portugal, por Fátima Freire Andrade. Cito exemplos de textos e palavras com significados distintos para portugueses e brasileiros.
Vejam: sobre um percurso de carro que ´foi feito em pára-arranca, e eu teria gostado de ter três pés para embraiar, travar e acelerar´. O que foi dito? Que um carro aumentava e diminuía a velocidade (pára-arranca), usando-se a embreagem (embraiagem), travando (freando) e acelerando. ´Agarrei na mão do miúdo´, segurei a mão do menino. ´Berma´ expressa acostamento. ´Era patusco de se ver´ é engraçado de se ver. ´Empregados e empregadas de mesa´ são garçons. ´Uma balda às aulas´ é gazetear, faltar às aulas. Estudantes portam ´badamecos´, que são pastas ou bolsas. O ´urinol´ não é o de antigo uso, mas o mictório público. ´Descapotável´ é o carro conversível. ´Comboio´ é trem e ´autocarro´ é ônibus que tem bicha (fila). Maria ´está a me fazer olhinhos´, está a piscar os olhos para mim. ´Isco´ é isca de peixe. Português não usa paletó, usa ´fato´, que pode estar na ´montra´ (vitrina).
Enfim, ortografia não disciplina linguagem. Vou parar por aqui, certo de que vocês estão confusos, mas não estão sós.
Também estou. Pois, pois.
João Soares Neto – Escritor – acesso em: http://www.soqueriaentender.com.br/?p=577 22/05/2011.

Texto Narativo 2

Tragédia brasileira

“Misael, funcionário da Fazenda, com 63 anos de idade.
Conheceu Maria Elvira na Lapa — prostituída com sífilis, dermite nos dedos, uma aliança empenhada e os dentes em petição de miséria.
Misael tirou Maria Elvira da vida, instalou-a num sobrado no Estácio, pagou médico, dentista, manicura… Dava tudo quanto ela queria.
Quando Maria Elvira se apanhou de boca bonita, arranjou logo um namorado.
Misael não queria escândalo. Podia dar urna surra, um tiro, urna facada. Não fez nada disso: mudou de casa.
Viveram três anos assim.
Toda vez que Maria Elvira arranjava namorado, Misael mudava de casa.
Os amantes moraram no Estácio, Rocha, Catete, Rua General Pedra, Olaria, Ramos, Bom Sucesso, Vila Isabel, Rua Marquês de Sapucaí, Niterói, encantado, Rua Clapp, outra vez no Estácio, Todos os Santos, Catumbi, Lavradio, Boca do Mato, Inválidos…
Por fim na Rua da Constituição, onde Misael, privado de sentidos e inteligência , matou-a com seis tiros, e a polícia foi encontra-la caída em decúbito dorsal, vestida de organdi azul.”
(Manuel Bandeira)

Texto Narrativo

A noite em que os hotéis estavam cheios
Moacyr Scliar

O casal chegou à cidade tarde da noite. Estavam cansados da viagem; ela, grávida, não se sentia bem. Foram procurar um lugar onde passar a noite. Hotel, hospedaria, qualquer coisa serviria, desde que não fosse muito caro.

Não seria fácil, como eles logo descobriram. No primeiro hotel o gerente, homem de maus modos, foi logo dizendo que não havia lugar. No segundo, o encarregado da portaria olhou com desconfiança o casal e resolveu pedir documentos. O homem disse que não tinha, na pressa da viagem esquecera os documentos.

— E como pretende o senhor conseguir um lugar num hotel, se não tem documentos? — disse o encarregado. — Eu nem sei se o senhor vai pagar a conta ou não!

O viajante não disse nada. Tomou a esposa pelo braço e seguiu adiante. No terceiro hotel também não havia vaga. No quarto — que era mais uma modesta hospedaria — havia, mas o dono desconfiou do casal e resolveu dizer que o estabelecimento estava lotado. Contudo, para não ficar mal, resolveu dar uma desculpa:

— O senhor vê, se o governo nos desse incentivos, como dão para os grandes hotéis, eu já teria feito uma reforma aqui. Poderia até receber delegações estrangeiras. Mas até hoje não consegui nada. Se eu conhecesse alguém influente... O senhor não conhece ninguém nas altas esferas?

O viajante hesitou, depois disse que sim, que talvez conhecesse alguém nas altas esferas.

— Pois então — disse o dono da hospedaria — fale para esse seu conhecido da minha hospedaria. Assim, da próxima vez que o senhor vier, talvez já possa lhe dar um quarto de primeira classe, com banho e tudo.

O viajante agradeceu, lamentando apenas que seu problema fosse mais urgente: precisava de um quarto para aquela noite. Foi adiante.

No hotel seguinte, quase tiveram êxito. O gerente estava esperando um casal de conhecidos artistas, que viajavam incógnitos. Quando os viajantes apareceram, pensou que fossem os hóspedes que aguardava e disse que sim, que o quarto já estava pronto. Ainda fez um elogio.

— O disfarce está muito bom. Que disfarce? Perguntou o viajante. Essas roupas velhas que vocês estão usando, disse o gerente. Isso não é disfarce, disse o homem, são as roupas que nós temos. O gerente aí percebeu o engano:

— Sinto muito — desculpou-se. — Eu pensei que tinha um quarto vago, mas parece que já foi ocupado.

O casal foi adiante. No hotel seguinte, também não havia vaga, e o gerente era metido a engraçado. Ali perto havia uma manjedoura, disse, por que não se hospedavam lá? Não seria muito confortável, mas em compensação não pagariam diária. Para surpresa dele, o viajante achou a idéia boa, e até agradeceu. Saíram.

Não demorou muito, apareceram os três Reis Magos, perguntando por um casal de forasteiros. E foi aí que o gerente começou a achar que talvez tivesse perdido os hóspedes mais importantes já chegados a Belém de Nazaré.

O texto acima foi publicado no livro "A Massagista Japonesa", Editora LPM — Porto Alegre, 1982, e extraído de "Contos para um Natal brasileiro", Editora Relume: IBASE — Rio de Janeiro, 1996, pág. 09.